21/05/2009

Elogio ao "coize"

Ora mais um livro que começei a folhear, porque para já ainda não li com muita atenção, mas já me deparei com aspectos de cortar a respiração, ou até mesmo de provocar um simples e arrepiante suspiro...
Diga-se que é uma grande lição de um actor até agora, para mim, desconhecido..sendo o seu nome: Miguel Esteves Cardoso. Apesar de ainda não o ter lido com cabeça tronco e membros, aconselho na mesma a quem já o leu todo, faça favor de reler. Quem não leu leia. E volte a ler. Uma, duas, três vezes. É o Elogio ao Amor, elogio da vida que vale a pena, desde que estejamos de bem connosco mesmos...

Começa aqui:

"Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro.
Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo. O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade.

Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria. Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em “diálogo”. O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem.

A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam “praticamente” apaixonadas. Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço.

Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do “tá bem, tudo bem”, tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso “dá lá um jeitinho sentimental”. Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade.

Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor.

A “vidinha” é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser.

O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra.
A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.”


Mais verdadeiro não há, é como o algodão!

P.S.: Jujinha depois eu empresto-te sim... xD

14 comentários:

Joana disse...

Eu diria que este Miguel é um realista social dos nossos tempos. Deve ser por apreender tão bem o vazio e a banalidade das relações entre os seus contemporâneos que se sente assim:

“Tenho o riso tão roto, tenho andado tão por baixo, que já não chego com as mãos à cabeça, já nem o riso consigo remendar. As lágrimas lavam-me a cara quando me deito e me levanto. Rasgam-me os lábios até às orelhas, cada vez que tento falar, para dizer aos outros que estou bem. Hoje vi-me ao espelho. Parecia um palhaço assassinado com uma faca. até a vontade de me rir eu perdi.”

Miguel Esteves Cardoso

Bruna Pereira disse...

Sobre este livro apetece-me sempre dizer o mesmo, que é:

Foda-se, que bonito.

Beijo Pedrosen

Joana Lima disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Joana Garcia ^^ disse...

Não há nada mais puro do que este excerto. Este escritor sentiu e escreveu. Nem pensou, nem calculou, nem "deu um jeito" nas palavras. Ele sente e faz-nos sentir.
Acabaste de fazer com que gaste o meu dinheiro em maaaaais um livro! És terrível Pedrinho *

Anónimo disse...

Fuck! Isto aleija :|

Márcio disse...

Aqui está um texto intenso, cheio de vontade. Daqueles em que nos sentimos cansados no final de o ler, nao por ser aborrecidos, mas por ter mais conteúdo do que o número de palavras inscritas no texto.

Mas nao me deixa trazer à memória aquela velhinha frase 'No meu tempo é que era!'. Acredito que hoje em dia se viva o amor de forma diferente por grande parte das pessoas, mas isso são sinais do tempo. Acredito que nesta vida moderna e comodista esta caracteristicas tb se "entornaram" para o amor, mas acredito tb que o amor puro co-habita com estas diferentes formas de amar de hoje em dia.

Quando digo que são sinais do tempo, a forma mais simples que me lembro para explicar isto é fazendo uma analogia. Antigamente, mais do que hoje em dia, havia os casamentos já feitos mesmo antes dos noivos se conhecerem, por interesses familiares e financeiros, hoje em dia tb existe só que de forma mais camuflada e adptada à vida de hoje.

Acredito que o amor puro sempre existe, o que difere é a forma de amor conveniente.


Mas gostei do elogio ao amor puro em forma de desabafo.


Tudo o que acima foi escrito, é uma opinião pessoal sobre o texto.

Juja disse...

woooow eu ja tnha lido parte dest texto na m lmbro onde..e na altura fiquei msm curiosa c o livro..so q entretnt passou -.-

sim sim empresta a mim =D

Mia disse...

"Acredito que o amor puro sempre existe, o que difere é a forma de amor conveniente."

concordo com o Márcio. o gajo anda aí, só que não é o q mais se vê (tou a falar do amor verdadeiro e não do Marcio xD). o que está mais patente hoje em dia são mesmo as relações de necessidade, explicando: estar com alguém só por conveniencia, para suprir carencia, como se de um entretenimento/passatempo se tratasse, um relacionamento 'só para não ficar sozinho'. ou seja, a sobrexpressão deste tipo de interacção fez com que os casos de amor verdadeiro agora se tomem como raros, ou então para os menos esperançados, inexistente.

Mas a esperança nunca se perde, e mesmo que se pense que ela não existe, aparece sempre algo que a faz saltar da sua caixa.

"querer e não guardar a esperança"

Por mais que amemos alguém e nunca sejamos correspondidos, acho dificil nunca termos uma réstia de esperança, ou então eu sempre fui uma pessoa cheia dela :p

Não tenho mais nada a declarar em relação ao "coize" :)

Cris disse...

Bem...penso que este magnífico texto descreve, na perfeição, a "situação amorosa" nos dias de hoje...hoje em dia já não se namora. Hoje em dia "anda-se", "curte-se" ou até, "come-se" (expressão horrivel e, infelizmente, utilizada muito frequentemente )...não entendo...não entendo o que aconteceu para as mentalidades desta geração pensarem de uma maneira tão "animalesca", de um modo tão primitivo...tenho 20 anos e por vezes sinto-me mal..sinto-me à parte do mundo dos meus amigos em que, se hoje estão com uma pessoa, amanha já estão com outra e, muito provavelmente, depois de amanhã estarão com outra que, até, conhecem no próprio dia...penso que a causa disto é a falta de amor próprio, a falta de respeito pela própria alma e pelo próprio corpo, a falta de segurança, de estabilidade, a pressa de viver...é a necessidade de se sentir desejado...pensam que se "curtiram" com alguém é porque até são bons, atraentes, interessantes...
Realmente...é caso para perguntar o que aconteceu ao amor "verdadeiro e puro"???...não sei...desapareceu...mas espero que um dia volte

Rui Costa disse...

Este texto do Miguel Esteves Cardoso consegue ser quase tão patético quanto ele.
Isto que ele diz não tem pés nem cabeça!

Antes de falar sobre o amor, ele deveria pelo menos dar-se ao trabalho de perceber o significado dessa palavra.

Este texto só tem frases bonitas e pelo facto consegue encantar/enganar muita gente, porque de em termos de sentido, não tem nenhum.
Só vejo contradições e incoerências.

Este texto para ter algum sentido, teria pelo menos que se mudar o titulo.
Teria que ser:" Elogio à Paixão".

Porque está muito claro que o Miguel Esteves Cardoso confundiu de forma grosseira o sentido do amor e da paixão...

Cumprimentos

Pedrosen disse...

Boas Rui!
Agradeço o comentário, mas tive que vir expressar o meu "discordar" da tua opinião!

No texto, onde é que tu vês incoerência e contradições?

Para alem disso, paixão é um sentimento totalmente distinto de amor, e é fácil de se perceber qual a sua real diferença, está na longevidade do "sentimento" nos nossos corações e também claro, no tempo que esse "sentimento" demora a ser ultrapassado!

A paixão é algo que os adolescentes hoje em dia tem quando vão à praia, ou quando vão passar férias a "Celorico da Praia" e conhecem uma miúda que até lhe fará as vontades nessa semana, mas que depois puff, desaparecem como as estrelas cadentes.

Abraço

Anónimo disse...

Oh Rui, estás de costas voltadas para "este lado" ne?

Só pode ...

Hélder (Kami) disse...

É para dizer mesmo a citaçao da bruna pereira... "Foda-se, que bonito."
É mesmo para deixar uma pessoa a pensar na vida, nas escolhas que fez, nas escolhas que nao fez e devia ter feito.
o que ele escreveu é a verdade por detras dos dias de hoje...
depois tens de me emprestar o livro xD

Mlady disse...

Vamos até ver por algo mais simples. Há alguma amizade sem um interesse? nem que seja aquele d simplesment nos fazer mais felizes ou menos solitarios? humm nah